O movimento pentecostal deve ser divido em quatrogrupos distintos.
O primeiro grupo é formado pelos pentecostais clássicos, que surgiram nos Estados Unidos com o movimento pela busca de santidade, empreendido pelos metodistas, e que deu origem às chamadas igrejas de santidade (holiness churches). Vinte e três novas denominações foram fundadas entre 1893 e 1900, defendendo a idéia de perfeição cristã (concepção oriunda de John Wesley e Charles Finney), segundo a qual, se o crente recebesse uma “segunda bênção”, atingiria um estágio na vida cristã em que seria possível não mais cometer nenhum pecado consciente e voluntário. Depois, essas igrejas se tomaram pentecostais. Charles Fox Parham, professor numa escola bíblica em Topeka, Kansas, concluiu que o fenômeno de línguas ocorrido em Atos 2 era evidência, para todos os cristãos, do batismo no Espírito. Em 10 de janeiro de 1901, Parham impôs as mãos sobre uma mulher — Agnes Ozman — que disse ter recebido o Espírito Santo. O pregador batista William Seymor, que havia sido aluno de Parham, começou a pregar sobre essas idéias numa igreja de santidade localizada na Rua Azusa, em Los Angeles. Um movimento de renovação começou em 9 de abril de 1906, e espalhou-se por todos os Estados Unidos, dando origem ao movimento pentecostal. Na década de 1910, esse movimento chegou ao Brasil, com a Congregação Cristã (1910) — que começou como uma divisão da Igreja Presbiteriana do Brás, em São Paulo, com a pregação do ítalo-americano Louis Francescon — e com a Assembléia de Deus (1911) — que começou como uma divisão originada por dois missionários suecos, Gunnar Vingren e Daniel Berg, na Primeira Igreja Batista de Belém do Pará. As ênfases principais dos pentecostais clássicos foram o batismo no Espírito Santo, o recebimento de dons carismáticos e miraculosos, principalmente o falar em línguas, e uma liderança centralizada.
O segundo grupo seria o dos pentecostais de “cura divina”. Os principais representantes desse movimento no Brasil foram a Igreja do Evangelho Quadrangular (1951), O Brasil para Cristo — a primeira denominação pentecostal de “cura divina” a ser fundada por brasileiros (1955) —, a Casa da Bênção (1964), e a Igreja Deus É Amor (1962). De maneira diferente à dos pentecostais clássicos, além de enfatizar as curas divinas, estes novos grupos passaram a praticar o exorcismo e a usar uma música mais popular, com ritmos nacionais, durante os cultos informais.
O terceiro grupo é o das igrejas renovadas, que começaram a ser organizadas em 1960. Dennis Bennett, pregador anglicano, declarou ter recebido o dom de falar em línguas, num culto, e o movimento se espalhou rapidamente entre luteranos, presbiterianos, metodistas e batistas. No Brasil, a Convenção Batista Nacional, a que são filiadas as chamadas igrejas renovadas, foi fundada em 1967, como divisão da Convenção Batista Brasileira. Presbiterianos e metodistas viram também várias congregações locais partirem para o que se chamou de “renovação espiritual”. Essas congregações mantiveram as mesmas ênfases dos pentecostais clássicos; a diferença fundamental está em que os últimos saíram das igrejas tradicionais e fundaram as suas, enquanto aqueles ligados às igrejas renovadas permaneceram, na maioria, em suas igrejas, para influenciá-las. Em 1967, o movimento carismático chegou também à igreja católica.
O quarto grupo, os chamados neopentecostais ou neocarismáticos, surgiu no final da década de 1970 e início da década de 1980. Suas principais ênfases são os sinais e maravilhas, com fortes elementos mágicos; confrontos com poderes demoníacos e exorcismos em meio a manifestações emocionais fortes; o predomínio da teologia da prosperidade (que enfatiza que o estar bem com Deus é prosperar financeiramente) e a idéia de “guerra espiritual”. Seu principal representante no Brasil é a Igreja Universal do Reino de Deus, fundada em 1977, e, com menor representatividade, dissidente da anterior, a Igreja Internacional da Graça de Deus, fundada em 1980. Quanto ao discurso presente nessas igrejas, notadamente na Igreja Universal do Reino de Deus, Wilson Gomes, “Nem anjos nem demônios”. In: Alberto Antoniazzi et al, Nem anjos nem Demônios, p. 230-231. escreve:
A categoria mais fundamental da filosofia e teologia implícitas no discurso e práticas da Igreja Universal do Reino de Deus é a posse. E seja bem claro que posse, nesse caso, não significa posse mística ou transe, mas a detenção de bens, em vista da sua fruição. Estes bens são geralmente descritos como elementos indispensáveis para aquilo que se pode qualificar de uma vida digna e feliz: saúde, prosperidade e amor. [...] É implícita neste imperativo a concepção segundo a qual a vida humana conforme a vontade de Deus, a vida humana autêntica, é aquela em que os homens possuem e desfrutam dos bens do mundo.
O falar em línguas perdeu sua importância nas igrejas neopentecostais. A ênfase dessas igrejas recai principalmente no forte uso dos meios de comunicação. Nos últimos anos, relatos dos fiéis falam de “sopro” do Espírito, “desmaios” pelo poder do Espírito, “arrebatamentos” (que envolvem viagens ao céu e ao inferno), o recebimento de “dentes de ouro” e a “unção do riso”.
As igrejas pentecostais de “cura divina” e as igrejas renovadas seguem, umas mais que as outras, os principais elementos doutrinários do pentecostalismo clássico. Os neopentecostais apresentam as maiores diferenças dentro do mundo pentecostal. É importante lembrar que esta classificação nem sempre é tão nítida, pois o pentecostalismo clássico e o que chamamos de neopentecostalismo acabaram por se influenciar mutuamente. Na verdade, o movimento pentecostal é um universo de contrastes, e seus grupos vão desde os que proíbem ver televisão, tomar banho de praia, gostar de futebol e dormir despido, até os que possuem entre seus membros jogadores de futebol, cantores e modelos famosos, além da música estilo rock, como nas “comunidades evangélicas”. Contudo, o pentecostalismo clássico e o neopentecostalismo não são a mesma coisa. Apesar de possuírem o mesmo tronco histórico, têm diferentes ênfases teológicas e usam diferentes estratégias para sua atuação no mundo e junto a seus fiéis. Por isso, ainda que genericamente classificados como neopentecostais, esse movimento é caracterizado por uma completa ruptura com a fé evangélica, oriunda da reforma protestante e reafirmada no movimento pentecostal clássico.
Podemos apontar algumas razões para o surgimento do movimento pentecostal:1) a influência do pragmatismo de Charles Finney e da introdução de suas “novas medidas” para alcançar o avivamento; 2) a reação antiintelectual aos confrontos entre “modernistas” (ou liberais) e ortodoxos, ocorridos no século XIX; 3) o condicionamento social, especialmente ocorrido entre os neopentecostais, em que há um comprometimento em atender às necessidades “mundanas” dos que buscam a Deus; 4) a perda de uma teologia abrangente do Espírito Santo que desse ênfase na aplicação experimental da obra da salvação — chamado, regeneração, fé, arrependimento, justificação, união com Cristo, adoção, santificação, perseverança e glorificação; 5) a mudança de paradigma no campo teológico, da ênfase na soberania e liberdade de Deus, dominante nos séculos anteriores, para a “autonomia” e liberdade do homem. Evidentemente, por causa da falta de uma teologia bíblica consistente, o movimento neopentecostal também deixou entreabertas frestas para a entrada de novas visões teológicas.
Por isso, o discurso neopentecostal não vê dificuldade nem empecilho para assumir conceitos e termos que fazem parte de outras esferas religiosas, inclusive de conceitos que inicialmente lhe eram antagônicos (como o catolicismo e o espiritismo), por terem surgido em esferas de oposição ao discurso dos neopentecostais.
Fonte:Franklin Ferreira, Alan Myatt - Teologia Sistemática
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