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Quem tem autoridade para falar da parte de Deus?

 Quem tem autoridade para falar da parte de Deus? Quem tem o direito de dizer que tem acesso privilegiado à mente e vontade divinas? Quem tem a prerrogativa de dizer aos outros como Deus é e o que ele requer de seu povo? Essas perguntas, como vimos nos trabalhos antecedentes, são fundamentais. Nenhuma comunidade cristã pode sobreviver sem concordar nessas questões. Todos os cristãos concordam que é essencial, para as igrejas e para os crentes como indivíduos, conhecer a vontade de Deus, mas quem pode nos contar a vontade de Deus?
Através da História, Deus tem colocado à nossa disposição o conhecimento dele e o conhecimento de sua vontade. Antes que Cristo viesse, Deus tornava conhecida a sua vontade através dos grandes profetas do Antigo Testamento (Hb 1.1). No tempo de Cristo, Deus nos falou através de seu Filho (vs. 1-4). E em nossa época? Quem fala por Deus hoje? Quem tem autoridade de falar no nome de Deus ao seu povo? Como a “Palavra do Senhor” soa como qualquer coisa que determinada corrente do pensamento secular ou que determinado pregador carismático estejam declarando, parece estar havendo uma cacofonia de barulhos diferentes. Lembra-nos a repreensão do Senhor em Jeremias 23.34-36:
Quanto ao profeta, e ao sacerdote, e ao povo, que disser: Sentença pesada do Senhor, a esse homem eu castigarei, e a sua casa, Antes, direis, cada um ao seu companheiro e cada um ao seu irmão: Que respondeu o Senhor? Que falou o Senhor? Mas nunca mais fareis menção da sentença pesada do Senhor; porque a cada um lhe servirá de sentença pesada a sua própria palavra; pois torceis as palavras do Deus vivo, do Senhor dos Exércitos, o nosso Deus.

Quem fala por Deus hoje? Tal autoridade daria a uma pessoa ou grupo de pessoas, o poder máximo — poder sobre as vidas, futuro e finanças do povo de Deus que, desejosas de obedecer a seu Deus, buscam ansiosamente conhecer sua vontade.
Falar porDeus pode facilmente degenerar em falar como Deus. De modo muito parecido, falar por Jesus Cristo pode rapidamente tornar-se falar como sefosse Cristo. Temos visto isso em sua forma mais grotesca no movimento Palavra de Fé, que se estende muito além da América do Norte. Ao relatar uma alegada visitação recebida de Jesus Cristo, Kenneth Copeland, que se chama evangélico, diz que Jesus lhe disse: Não se perturbe quando as pessoas o acusarem de achar que é Deus... eles me crucificaram por eu dizer que era Deus. Uma das tendências mais perturbadoras em alguns desses lideres mais irresponsáveis e a disposição de ofuscar a distinção essencial entre a vontade de Deus e a vontade do próprio líder.
Assim Copeland é capaz de colocar-se no mesmo plano que Jesus Cristo, dizendo ter a mesma autoridade divina. Nessa visão, ele ouve a Cristo dizer: Eu não disse que eu era Deus, disse apenas que andava com ele e que ele estava comigo. Aleluia! É o que você esta fazendo. Note a estratégia: nega-se a singularidade de Cristo. Cristo não era Deus, apenas andava bem junto dele — e, pede-se que assim creiamos — Copeland também. A distinção essencial entre Cristo e os cristãos, vital como salvaguarda contra a liderança irresponsável e as tendências teológicas mais grotescas normalmente ligadas ao movimento de Nova Era, são negadas. Por esta razão, Copeland parece achar que ele e Jesus Cristo tem mais ou menos a mesma autoridade para o crente. Como Jesus não faz apresentações pessoais na televisão, nem anda no circuito de palestras ou entrega sermões personalizados, os que dizem ter autoridade no mesmo nível dele tem uma vantagem significativa sobre ele. Imagine ter a mesma autoridade espiritual que Jesus! Imagine ter o mesmo poder carismático que ele! E irresistível.
Benny Hinn, autor do best-seller Bom Dia Espírito Santo, diz o seguinte: Você esta pronto para um verdadeiro conhecimento de revelação? Observe isso: Ele deixou de lado sua forma divina. Ora, estes são sete passos da gloria até a cruz. Ele deixou de lado sua forma divina. Por que? Para que um dia eu fosse revestido da forma divina. Imagine o poder de dar as pessoas verdadeiro conhecimento de revelação! Para isso, ele, como Copeland, esta disposto a alterar a visão bíblica histórica de Cristo e entrar no seu lugar. “Estamos no mesmo nível que o Filho sobre a terra” ele acrescenta. Os que nos desprezam são um bando de imbecis... não toques num homem de Deus.
Isso e verdade não só com aqueles que dizem ter linha direta com conhecimento da revelação como também com os que exigem obediência aos seus ensinos ou regulamentos morais com devoção cega. Muitas vezes podemos perguntar a um crente em certos círculos evangélicos se ele crê em determinado ponto. Perguntando a seguir por que e como chegou a essa conclusão, ele respondera Bem, o Pastor Fulano de Tal diz que a Bíblia diz. Como os cristãos da Idade Media, em nossos dias estamos dispostos demais a deixar que os profissionais pensem por nos.
A viagem de poder ligada a essa autoridade e precisamente o ponto feito por Max Weber no seu famoso ensaio sobre A Sociologia da Autoridade Carismática. Numa época em que estruturas tradicionais de poder parecem em declínio ou confusos, as pessoas se dispõem a buscar autoridade em outro lugar. Onde a sociedade parece confusa quanto a seus próprios valores morais e onde instituições acadêmicas tradicionais parecem confusas quanto a questões da verdade, as pessoas procurarão — e encontrarão — quem fale com voz clara e ofereça soluções curtas, limpas e autorizativas. O evangelicalismo de poder deve uma parte de seu poder a sua forca de convencimento: talvez não tanto pelos pontos de vistaque tenham ou doutrinasque preguem, mas a convicçãoe autoridade com qual elas são mantidas e pregadas.
Ha aqui uma lição importantíssima para as denominações tradicionais do protestantismo, que perdem membros aos montes por não pregar um evangelho claro com convicção, ou liderar no oferecimento de direção moral. Mas há também uma lição vitalmente importante para o próprio evangelicalismo de poder. A força da convicção não é critério adequado da verdade. Alguém pode ser forçosamente, como também sinceramente, errado. O apelo às experiências subjetivas de Deus, a visões pessoais, palavras de sabedoria esotérica e não verificáveis e convicções forçosas, mas não comprovadas, e poderoso tanto quanto perigoso. O evangelicalismo de poder desenfatiza os meios objetivos pelos quais essas visões e revelações podem ser examinadas a luz de critérios oferecidos ao povo em geral, ou seja, a luz das Escrituras. A marginalização da Bíblia dentre certos tipos de evangelicalismo hoje (inclusive dentro de grupos que aderem a uma posição oficial de inerrância) e um dos maiores escândalos de nossa era.


Fonte: Religião de Poder - Editor:Michael Scott Horton.

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