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OSÉIAS - Um casamento em crise e sua mensagem.

Com a profecia de Oséias, chegamos ao primeiro dos doze livros conhecidos como “Os Profetas Menores”. Eles são chamados “menores” não por terem importância secundária, mas por serem curtos em relação aos livros de Isaías, Jeremias e Ezequiel.
Uma das dificuldades com respeito aos livros proféticos é que eles não estão dispostos na Bíblia em ordem cronológica, portanto precisaremos trazer à memória o cenário histórico em cada caso. Algumas vezes a data precisa do ministério do profeta é dada no versículo inicial, mas, em outras, não recebemos esta informação, que seria extremamente útil; então, temos que procurar discernir esse detalhe pela mensagem do profeta.
Oséias foi um dos profetas mais simpáticos dos tempos do Antigo Testamento. Ele era do norte e pregava a seu próprio povo, no reino de norte (Israel), antes de sua queda e colapso. Ele é um do grupo que, por vezes, chamamos “os profetas do oitavo século”, o que inclui também Amós, Miquéias e Isaías. Você poderá lembrar-se, pelas nossas leituras dos Livros Históricos, de que os territórios do norte foram invadidos pelos exércitos assírios e de que a capital, Samaria, caiu em 721 a.C., depois de um dos mais longos e terríveis cercos da história. Antes desses eventos importantes, Oséias recebeu a incumbência de chamar Israel de volta a Deus; e ele o fez de modo muito eloquente e com um apelo profundamente sensível e apaixonado. Ele era extremamente talentoso na arte de usar palavras e pintou alguns quadros bem vivos de um Deus amoroso e de sua misericórdia para com seus filhos rebeldes e recalcitrantes.
O livro toca em alguns temas proféticos altamente importantes e retorna constantemente a eles. Reitera uma mesma mensagem, apresentando-a de modo novo e com o auxílio de palavras que sugerem um apelo visual. Por isso, não é possível analisar o livro capítulo por capítulo, num grupo de divisões claras; talvez seja de maior utilidade chamar a atenção para alguns de seus grandes temas. Poderemos tomar como ponto de partida um de seus ditos mais descritivos: “seu cabelo vai ficando grisalho, mas ele nem repara nisso” (Os 7.9). Com essa imagem viva, Oséias está dizendo que a vida espiritual e moral da nação decaiu seriamente, que a nação é parecida com a pessoa que está completamente despercebida de seus primeiros cabelos brancos! Quais foram os sinais de declínio que Oséias tinha tão perceptivamente observado na vida de seu povo?

1. Votos quebrados

O termo chave de Oséias, a palavra hebraica “hesed” (amor aliança), é traduzido em português como misericórdia, bondade, amor constante, amor fiel. Deus amou seu povo profundamente e esse povo estava ligado a ele num relacionamento de aliança, como num casamento. Mas este povo foi atrás de outros amantes e quebrou seus votos de amor, de aliança e de lealdade. Oséias não pregava sobre esses assuntos meramente como frios fatos doutrinários. Ele conhecia um pouco daquilo que Deus devia ter sentido, porque sua própria esposa havia feito o mesmo que a nação de Israel. Ela tinha abandonado a ele e a seus filhos e ido atrás de outros amantes (1.1 - 2.13). George Adam Smith disse de Oséias: “Sua aflição tornou-se o seu evangelho”. Mas assim como Oséias foi atrás de sua esposa, na esperança de ganhá-la de volta, assim Deus pleiteava com seu povo, rogando que voltasse a ele (2.14-23). A esposa do profeta tinha caído em terrível degradação, e para tê-la de volta ele teve de comprá-la, porque já era escrava da vida de prostituição e adultério, mas o fez ansiosa e voluntariamente, porque a amava muito (3.1-5). Essa tragédia em seu próprio casamento tornou-se uma parábola da tristeza de Deus por causa de seus filhos, aos quais faltava amor. Eles também haviam se tornado prostitutos, indo atrás de outros deuses (4.11 - 5.4).

2. Líderes inúteis

Uma das graves dificuldades que os profetas do século VIII tiveram que enfrentar foi o sério fracasso moral de muitos dos profetas e sacerdotes contemporâneos. Homens que deveriam ter sido um exemplo espiritual valioso para seus conterrâneos eram espiritualmente decadentes e corruptos (4.1-10). Além disso, Oséias insistia em que os reis do reino do norte nunca poderiam ser líderes úteis, de um ponto de vista espiritual. Ele sabia que nunca foi propósito de Deus a terra ser dividida entre norte e sul, Israel e Judá. A intenção dele era que seu povo vivesse j unto, em um reino unido, sob reis devotos que fossem da linhagem de Davi. Não podiam esperar prosperidade espiritual quando eles próprios serviam ao tipo errado de rei (3.4-5; 7.3-7; 8.4; 10.7; 13.10-11).

3. Amigos errados

Em toda sua fraqueza, os líderes do reino do norte buscavam o auxílio de seus vizinhos pagãos. Embora Israel fosse material e economicamente próspero, Deus fez esse povo decair. Com medo de ser invadido por um inimigo poderoso, tentavam fortificar-se e fortalecer sua posição fazendo alianças com outros países. Todos os profetas viam esse tipo de procedimento como indicação clara de falta de confiança em Deus, e como a mais séria expressão exterior de desobediência e apostasia (5.13-14; 7.8-16; 8.8-10; 12.1; 14.3).

4. Culto corrupto

O que mais entristecia os profetas deste período era o fato de que, enquanto acontecia toda essa apostasia, não havia falta de sacrifícios e ofertas sobre os altares de ambos os reinos, mas eles não eram oferecidos ao Senhor Deus como expressão de profunda gratidão e transbordante amor. A vida espiritual da nação tornara-se contaminada por práticas religiosas que eles tinham adotado dos cananeus, que viviam nessa terra antes de eles chegarem. Estas incluíam toda sorte de rituais e cerimônias degradantes, como a “prostituição sagrada”. Oferecia-se culto a Baal, o deus da terra adorado pelos cananeus. Se havia uma colheita especialmente boa, os israelitas atribuíam esse favor generoso a Baal em vez de ao Senhor Deus que lhes havia trazido à Terra Prometida (2.8-13; 7.14-16; 8.11-13; 10.1-10; 11.1-2).
Contudo, a despeito de sua rebelião e depravação, Deus os amava. Mostrara seu amor há longo tempo, tirando-os da escravidão egípcia (11.1, 3). Mesmo quando o tinham entristecido, não lhe era possível desistir deles (11.8-9). Ansiava que voltassem para ele. Assim como o próprio profeta fizera tudo que lhe era possível para recuperar sua esposa de seu pecado e degradação, do mesmo modo Deus implorava a Israel que voltasse para si (14.1-2). Ele desejava amor firme, amor de aliança (hesed) e não sacrifício (6.6). Se voltassem a ele em sinceridade de coração, seriam perdoados (14.2) e curados (14.4), e Deus os estabeleceria e faria com que prosperassem em todos os seus caminhos (14.4-7).
A mensagem de Oséias a Israel é muitíssimo relevante em nossas próprias vidas. Às vezes as pessoas cristãs perdem seu “primeiro amor” como fizeram os cristãos da igreja de Éfeso (Ap 2.4). Nós quebramos nossas promessas de amor. Isso às vezes acontece porque, como os israelitas do tempo de Oséias, nos envolvemos com amigos errados. Quando perdemos nosso amor para com Deus, nossa assistência aos cultos dominicais e mesmo nossa leitura bíblica diária e oração podem degenerar rapidamente em ritual mecânico. O amor de Deus é tão grande que ele anseia ver-nos retornar para ele. Muitas vezes ele planta um espinheiro em nossos caminhos para que nós, como o povo do reino do norte, sejamos impelidos a entrar na presença dele (2.6-15) para encontrar perdão, restauração e renovada alegria.

Fonte:Entendendo o Antigo Testamento - Raymond Brown.

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