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A EPÍSTOLA AOS GÁLATAS.



Esta epístola representou, por seu lado dogmático, um papel particular nos períodos de combate da história da Igreja, por exemplo, durante a Reforma do século XVI. O assunto primordial que trata das relações entre a lei e a graça, entre as obras e a fé no ato redentor de Jesus Cristo, reencontrar-se-á, mais larga e metodicamente desenvolvido, na epístola aos Romanos. Aqui, em Gálatas o pensamento paulino ainda se acha em sua fase de elaboração. Além disso, a ocasião desta epístola é diferente. Ela deve sua origem a um ataque dirigido contra a própria pessoa de Paulo, contra seu ensinamento e sua autoridade de apóstolo, da parte dos cristãos judaizantes, agarrados à Lei e que não compreenderam a novidade do Evangelho (cf. I. 6 a 3. 1). Paulo insiste sobre o fato de que ele recebeu o Evangelho diretamente, por uma revelação da parte de Cristo, e, sem o intermédio de uma transmissão humana, o apostolado, função única, excluindo qualquer transmissão de homem a homem. Tentemos definir a situação histórica e a data da epístola aos Gálatas.

Quem são os Gálatas? A questão é menos simples do que poderia parecer, porque duas regiões da Ásia Menor, uma ao norte, a outra ao sul, levavam o nome de Galácia. A Galácia do Norte, quer dizer a região de Pessino e de Ancira (hoje Ancara), entre o Ponto, a Bitínia e a Licaônia, era habitada por uma população céltica (daí a palavra «Gálatas), que lá se estabelecera em princípios do século III a.C. Em 50 a.C., Amyntas, último rei dos Gálatas, une a seu território, a Licaônia e Pisídia, duas regiões meridionais. Com sua morte, em 25 a.C., todo o território de Amyntas, passa aos romanos que fizeram do mesmo uma só província administrada por um mesmo legado. Esta província romana, estendendo-se do norte ao sul, levava um título muito longo que enumerava todas as regiões que englobava. Este título foi, por comodidade, abreviado em «Galácia», como o atestam Tácito, Ptolomeu e Plínio. À linguagem popular, no entanto, parece ter reservado o uso da palavra «Galácia» à região setentrional. Ora, Paulo circulou na Galácia do Sul (região da Pisídia. Icônio, Listra e Derbe) durante a sua primeira viagem missionária. Segundo Atos 13. 14 ss, ai fundou igrejas que visitou em seguida por ocasião de sua segunda viagem (Atos 16. 1). Mas durante esta segunda viagem missionária, também foi à Galácia do Norte, e lá igualmente, fundou igrejas, visitadas por ele novamente, no decorrer de sua terceira viagem (Atos 18. 23).

À quais destas igrejas se endereça Paulo, àquelas do Norte ou àquelas do Sul? Da resposta a esta questão, depende a datação de nossa epístola. É provável que tenha chamado de «Gálatas» os habitantes das cidades helenizadas da Galácia do Sul (cf. 3. 1: «Ó gálatas insensatos!»). Uma terceira solução consistiria, evidentemente, em pensar que Paulo escreve a todas as igrejas da província da Galácia, do norte ao sul; mas as invectivas precisas e diretas que ele lança aos «gálatas», não poderiam convir a todas estas igrejas, tão diferentes umas das outras. Endereça-se, portanto, antes, a um pequeno grupo menor de igrejas localmente determinadas. Por outra parte, quando o livro dos Atos fala de uma «região da Galácia» (16. 6 e 18. 23) o faz sempre em associação com a Frigia, região setentrional, e para marcar uma etapa em um percurso apostólico rumo ao norte. Concluímos, pois, que esta epístola é endereçada aos cristãos de origem céltica da Galácia do Norte, a região de Pessino e de Ancira.

Qual é sua data de redação? Em 4. 13 Paulo lembra que, quando veio «pela primeira vez» aos gálatas, estivera enfermo, portanto, esteve lá já duas vezes. Se se trata da Galácia do Norte, as duas visitas não são aquelas de Atos 13. 14 e 16. 1 (Galácia do Sul), mas aquelas de 16. 6 e 18. 23. Esta epístola foi, pois, redigida após a segunda dessas passagens de Paulo pela Galácia do Norte, quer dizer, no percurso da terceira viagem missionária, por conseguinte, a mais cedo, cerca de 52 — 53, e, provavelmente, em Éfeso.

Fonte: A Formação do Novo Testamento - Oscar Cullmann.

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