Karl Rahner nasceu em Freiburg-im-Breisgau em 1904. Ele uniu-se aos jesuítas e em 1948 tornou-se professor de teologia dogmática em Innsbruck. Desde então tem também ocupado cátedras nas universidades de Munique e Münster. É o autor de uma série de vários volumes de Investigações Teológicas,cada uma compreendendo uma coleção de ensaios arranjados em tópicos. Também escreveu uma teologia sistemática intitulada Fundamentos da Fê Cristã, o originalalemão do qual apareceu em 1976. Foi (indiscutivelmente) o maior teólogo católico romano de sua geração, mas sua abordagem à teologia tem agora sido alcançada pelas mais radicais de Schillebeeckx e Küng.
Rahner é famoso pela sua teoria do “cristianismo anônimo”. A posição católica romana tradicional, enunciada com rude clareza por Cipriano e reafirmada no Quarto Concilio de Latrão, é que não há salvação fora de uma igreja católica visível organizada. Não há salvação em nenhuma das “igrejas” rivais. Isto foi declarado ainda mais precisamente pelo Papa Bonifácio VIII em sua bula de 1302 Unam Sanctam:“Nós declaramos, afirmamos e definimos que é completamente necessário para a salvação de toda criatura humana estar sujeito ao pontífice romano [papa]”. Estas declarações ainda são aceitas na Igreja Católica Romana - mas “reinterpretadas”. Em 1854, o Papa Pio IX reafirmou a doutrina tradicional, mas com uma qualificação vital - aqueles que são “ignorantes insuperavelmente” da religião verdadeira (isto é, aqueles cuja ignorância não é por sua negligência) são excetuados. Em 1949 houve um desenvolvimento adicional. O Padre Feeney, um sacerdote linha-dura de Boston, insistia em ensinar a concepção tradicional. Roma respondeu que a declaração “fora da igreja não há salvação” continua verdadeira, mas que era para o magistério, o ofício de ensino na igreja, interpretá-la, não o indivíduo em particular. A controvérsia prolongou-se enfadonhamente e em 1953 Feeney foi excomungadocomo um rigorista obstinado. O Segundo Concilio Vaticano também foi claro em rejeitar a antiga interpretação:
Aqueles também podem alcançar a salvação eterna que por nenhuma negligência deles mesmos não conhecem o evangelho de Cristo ou sua igreja, porém sinceramente buscam a Deus e, movidos pela graça, esforçam-se por seus atos para fazerem a vontade dele como ela é conhecida a eles através dos ditames da consciência. Nem a providencia divina nega a ajuda necessária para a salvação daqueles que, sem culpa de sua parte, não tem ainda chegado a um conhecimento explicito de Deus, mas que se esforçam para viver uma boa-vida, devido à graça dele. A Igreja 2:16
[A salvação não é] apenas para os cristãos, mas para todos os homens de boa-vontade em cujos corações a graça opera em uma maneira não vista. Porque, uma vez que Cristo morreu por todos os homens e uma vez que a vocação final do homem é de fato única e divina nós devemos crer que o Espirito Santo de uma maneira conhecida apenas por Deus oferece a cada homem a possibilidade de ser associado com seu mistério pascal. A Igreja no Mundo Moderno 1:22
Mas por outro lado, O Vaticano II também declarou: “Qualquer que souber que a Igreja Católica foi feita necessária por Deus através de Jesus Cristo, mas se recusa a entrar nela ou a permanecer nela, não poderia ser salvo”.
A teoria de Karl Rahner procura explicar estas declarações. Deus deseja que todos sejam salvos (1 Tm 2.4) e a fé em Jesus Cristo é necessária para a salvação. Isto implica que todas as pessoas têm a chance de crer - e esta é uma chance histórica verdadeira, não meramente abstrata ou teórica. Como isto pode ser verdadeiro? Porque a graça de Deus está operando em todosos homens. Até que um indivíduo seja efetivamente confrontado pelo evangelho cristão, a graça de Deus em Jesus Cristo pode alcançá-lo através de uma religião não-cristã. Mais do que isto, a graça de Deus está em operação mesmo no ateu, que pode portanto ter verdadeira fé, esperança e amor cristãos, enquanto ainda permanece ateu. “Mesmo um ateu ...não está excluído de alcançar a salvação, uma vez que ele não tem agido contra sua consciência moral como resultado de seu ateísmo.” Mas como pode se dizer que tal pessoa acredita em Deus? Porque é Deus que ele está encontrando em sua consciência, embora não perceba. De acordo com a “filosofia transcendental” de Rahner, a experiência do transcendente de cada um, o “mistério absoluto”, é uma experiência de Deus.
A pessoa que aceita uma exigência moral de sua consciência como absolutamente valida para ela e a segue como tal em um ato livre de afirmação - de qualquer modo não refletido - afirma o absoluto ser de Deus, quer ela saiba ou o conceitue que não, como a própria razão porque pode haver tal coisa como qualquer exigência de absoluto moral. Investigações Teológicas, Volume 9, Capitulo 9
Estes “cristãos anônimos” são salvos não por sua moralidade natural, mas porque eles têm experimentado a graça de Jesus Cristo sem percebê-la. Nós precisamos distinguir entre fé explícita e uma que é verdadeira, mas não articulada - o que ainda não tem penetrado do coração para a cabeça.
O “cristão anônimo” no sentido do termo e o pagão após o inicio da missão cristã, que vive num estado de graça de Cristo pela fé, esperança e amor, porém que não tem conhecimento explicito do fato que sua vida é orientada em salvação de graça-gratuita para Jesus Cristo... Deve haver uma teoria crista para dar a razão do fato que todo individuo que não, em qualquer sentido absoluto ou final, age contra sua própria consciência pode dizer e diz em fé, esperança e amor, Abba em seu próprio espirito e é por este motivo em toda verdade irmão dos cristãos à vista de Deus. Investigações Teológicas, Volume 14, Capitulo 17
Estas idéias, como explicadas por Rahner e outros, são muito influentes hoje, especialmente a de que alguém pode ser um cristão anônimo sem qualquer tipo de compromisso religioso. O cristão anônimo é alguém que “aceita a si mesmo em uma decisão moral”, mesmo se aquela decisão não é feita “de uma maneira religiosa ou ‘teísta’”. Isto serve para justificar o “cristianismo secular” - a interpretação da mensagem e missão da igreja em termos progressivamente seculares, como visto em recentes declarações do Concílio Mundial de Igrejas e Teologia da Libertação. Se a essência do discipulado cristão pode ser manifestada sem qualquer elemento religioso consciente, a igreja é justificada ao abandonar suas preocupações religiosas em favor de preocupações sociais e políticas vitais e prementes do dia. Talvez a maior fraqueza da teoria de Rahner seja a transformação de uma possibilidade excepcional (que alguém que não tem ouvido o evangelho possa estar em um estado de graça) em uma norma - de modo que a igreja deve tratar todos os homens como se eles fossem provavelmente cristãos anônimos, enquanto a abordagem bíblica como se eles fossem perdidos. Karl Rahner morreu em 1984.
Fonte:Tony Lane - Pensamento Cristão - Da Reforma à Modernidade - Volume 2.
Nenhum comentário:
Postar um comentário