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O TESOURO ESCONDIDO MATEUS, 13:44-45.



Da série de sete parábolas registradas no capítulo 13 de São Mateus, as quatro primeiras Cristo as proferiu, de um barco que lhe serviu de púlpito, tendo como auditório a multidão em pé, na praia (13:2), expondo o reino de Deus, mais no seu caráter geral, no seu aspecto universal e exterior. Agora inicia nova série, de três, em que o seu auditório se reduz a seus discípulos (13:36) e em que fala mais na intimidade, na casa que costumava frequentar. Além da explicação que dá da parábola do joio, em resposta a um pedido, e numa ampliação de seu pensamento, apresenta o reino nas suas relações particulares, em que o indivíduo dele se beneficia por urna apropriação pessoal. As duas primeiras, a do tesouro escondido e a da pérola de grande preço, têm alguns pontos em comum e algumas caraterísticas diferenciais que vamos observar, sendo em certo sentido, uma complementa da outra. Para que o cristianismo não fosse malbaratado e depreciado pelos espíritos críticos e superficiais que não entenderiam as figuras anteriormente usadas, Jesus passa dos objetos de pequeno valor, como os diferentes solos, as sementes do trigo e joio, a de mostarda, e fermento, para os de subido valor, como o tesouro escondido e pérolas, para despertar o desejo de realizar o fim supremo da vida, pela escolha de um padrão de valor absoluto. A circunstância básica e proeminente desta parábola é o objeto, o tesouro escondido, a cousa em si, que é achada, e não a pessoa, como vamos observar na outra.

O sentido da parábola é rico e inesgotável. Várias interpretações admissíveis, são extraídas da distinção entre o campo e o tesouro. Para uns, o campo é a Escritura sagrada o livro da revelação de Deus que o próprio Cristo apresentou como dando testemunho dele, na recomendação de seu exame e pesquisa, e realmente todo escriba nela versado tira cousas novas e velhas (v. 52); e o tesouro é a pessoa de Cristo que nele se descobre, do princípio ao fim. Cristo é tudo nesse depósito sagrado ou nesse campo divino. Outros entendem que o campo representa a Igreja, visível, externa, e o tesouro, a Igreja interna, invisível e espiritual. Assim a Igreja aparece não como instituição humana, mas divina e distribuidora dos dons celestes, diferente de todas as sociedades terrenas ou organizações humanas, com as quais, muita vez, ela se confunde. O campo e o tesouro se confundem e da mesma forma Cristo e a sua Igreja não podem separar-se da vida do crente. Não é possível ter-se Cristo no coração e combater a Igreja. A descoberta do tesouro é por acaso. Alguém trabalhando no campo, talvez assalariado, ou mesmo passeando, acidentalmente, dá com ele. Ocorrência frequente no Oriente, por causa das mudanças frequentes das dinastias, revoluções e invasão de exército estrangeiro, os ricos dividiam sua fortuna em três partes; a primeira empregada no seu comércio e manutenção própria; a segunda, em joias, para facilitar a fuga e a terceira era enterrada ou escondida. Muitas vezes, pela morte do rico avarento, que a ninguém comunicava o lugar, em que fora escondido o seu tesouro, perdia-se o mesmo, e daí a crença generalizada na existência de tesouros, cuja pesquisa era muitas vezes acompanhada de riscos. Estão expostos, ainda hoje, aos mesmos riscos, todos os que empreendem pesquisas nas escavações arqueológicas. Trench apresenta como tipos representativos dessa descoberta por acaso, Natanael e a mulher samaritana, de temperamento passivo e receptivo. Achar e esconder, indicam uma ação contemporânea, provisória, não egoística, visando a consolidação posterior da descoberta e posse, pelas novas atitudes que toma o seu descobridor, pelas suas precauções necessárias, habilidade e dependência do preenchimento de outras condições. O medo não é de que outro o ache, no caso, mas de que ele mesmo o perca.

E transbordando de alegria. É tão intensa a alegria expressa que vai determinar a renúncia e o sacrifício de tudo quanto possui, para aquisição do valor supremo encontrado. O Evangelho de Cristo ou o reino que se instala no seu coração, traz essa alegria. No capítulo primeiro de João, foi muito expressiva esse achado, na experiência dos primeiros discípulos de Jesus. Era um júbilo intenso, radiante, comunicativo. Só não se dispõe a receber esse tesouro para também ser comunicado a outrem, um como aquele jovem rico que se retirou pesaroso e triste, por não compreender o bem supremo da vida, embora aparentemente estivesse à sua procura sem, porém, querer pagar-lhe o devido preço. A sua posse exige renúncia. Para comprá-lo tem de vender tudo. Cada um tem algo diferente a renunciar; um é uma predileção qualquer que o compromete; outro é o dinheiro que o escraviza; outro é a preguiça que lhe traz a miséria; outro é o prazer que o arruína. Vender tudo é subordinar tudo a esse propósito central e dominante na vida, como fez Paulo, que considerou tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo e como refugo para ganhar a Cristo. Não encontramos nesta parábola a mesma dificuldade, da parábola do mordomo infiel ou do juiz iníquo, que alguns críticos querem encontrar, pois a própria legislação judaica e romana, estabeleciam a distinção da propriedade do campo, da riqueza subsolo, que as novas legislações confirmam com amplitude. A ação do homem é honesta, justa e recomendável para a habilitação legal de sua posse. Para conseguirmos as riquezas incompreensíveis de Cristo e a sua posse plena, abandonemos tudo aquilo que é precário. Sacrifiquemos interesses mundanos, virtudes farisaicas, paixão da carne, tudo que temos e somos do velho homem, para a posse do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade.
 


Fonte: Ensinos de Jesus Através de Suas Parábolas - Sátilas do Amaral Camargo.

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